Ideias que vencem

Oriunda de uma família com tradições no vinho, na região do Douro, Tatiana Sá Marques desenvolveu uma nova cuba de betão para fermentar e armazenar vinho. Para realizar este trabalho, a jovem engenheira investigou, fez diversas experiências e análises até chegar ao produto final. Uma cuba inspirada no passado mas adaptada ao futuro.

O avô e o tio avô produziam uvas para vinho do Porto e eram figuras respeitadas na comunidade do Douro superior; a mãe é engenheira civil e professora na Universidade de Coimbra; a irmã é produtora de vinho e enóloga na Conceito Vinhos. Não é por isso de estranhar que Tatiana Sá Marques, de 33 anos, tenha seguido os passos da mãe na profissão e a inspiração nos restantes familiares para se dedicar ao mundo vínico… mas através da engenharia, mais especificamente a fazer cubas de cimento para fermentação das uvas e armazenamento do vinho.

Tudo começou há uns anos, quando a irmã – a enóloga Rita Marques – regressada de uma vindima na África do Sul, lhe falou de umas modernas cubas de cimento que vira na adega onde trabalhou, uma ideia que Tatiana guardou e desenvolveu mais tarde, pensando na tradição das cubas de cimento que antigamente se usavam, mas adaptadas aos dias de hoje. Aproveitando a pesquisa bibliográfica que fez para o doutoramento no Instituto Superior Técnico, na área de análise estrutural de elementos de casca finas em compósitos cimentícios de elevado desempenho, acabou por dar o pontapé de saída ao seu projecto ao fundar com a mãe, Carla Costa Ferreira, a empresa WiseShape, a primeira empresa a desenvolver cubas de cimento portuguesas. Mais recentemente juntou-se à equipa a engenheira eletrotécnica Catarina Simões, que ficou responsável pela parte comercial. «Portugal tem uma tradição e prestígio na produção de vinho de qualidade, mas nunca desenvolvemos equipamentos e tecnologia directamente envolvidos no sector vínico. Achei que seria uma boa oportunidade», afirma Tatiana Sá Marques, co-fundadora e gestora executiva da WiseShape, acrescentando ainda que «a nova cuba de vinho em betão é destinada ao segmento de vinhos de qualidade superior e premium».

Ao contrário do que se poderia imaginar, Tatiana não analisou o cimento dos seus concorrentes, quis ela própria fazer experiências e tirar conclusões. «Preocupei-me apenas em alcançar os resultados que pretendia. Um material que fosse resistente, mais durável, poroso e com permeabilidade que permitisse uma micro-oxigenação suave do vinho, assim como uma temperatura constante. Após várias experiências cheguei a este betão, de alta performance – high-performance concrete (HPC) – que tem uma elevada resistência mecânica, muito superior ao betão tradicional usado na construção civil», explica a jovem engenheira. «O nosso betão é constituído por 15 a 20% de cimento e entre 80 a 85% de água e inertes naturais siliciosos. Assim, o vinho contacta apenas com elementos naturais, sustentáveis e 100% recicláveis», defende ainda.

No formato, Tatiana também tentou inovar, já que as antigas cubas de cimento são quadradas e as mais modernas são geralmente ovais. Acabou então por optar por um meio termo, um design diferente e moderno, mas funcional: «Quando comecei a estudar a forma de optimizar os momentos de fermentação e armazenamento, cheguei à conclusão que queria uma solução híbrida entre um sólido de revolução (cilindro) e uma forma existente na Natureza (ovo)», sublinha Tatiana. «Design sem função é apenas arte, e a cuba da WiseShape também tem um design artístico mas sem nunca deixar de lado a sua utilidade. Assim, inspirei-me em secções de elipses que vão afunilando de modo a gerar um movimento natural e fluido do vinho. O design da forma garante que não existem zonas mortas nem efeito de ‘curto circuito’ na movimentação de líquido ou massas vínicas no processo de remontagem».  

Para já, a empresa lançou a cuba WiseShape com capacidade para fermentar e armazenar 3,700 litros de mosto e vinho, respectivamente. Por encomenda – e já em produção – existe também o modelo abaixo, com capacidade para 1,000 litros, para vinificações de menor quantidade. Uma vez que cada cuba é concebida de forma dedicada e com recurso a intervenção humana especializada – e não produzida em série – a WiseShape oferece também a possibilidade de customizar a volumetria às necessidades dos clientes, em caso de especificidades e necessidades muito próprias. E até nas cores pode haver pedidos especiais por encomenda embora as de catálogo seja apenas três: branco, terracota e cinzento grafite.

Fora a questão estética, existe ainda outro aspecto fundamental: «As nossas cubas são competitivas com as soluções de gerações anteriores disponíveis nos mercados internacionais e nacionais. Além disso, temos melhor qualidade e melhor preço, nomeadamente na relação investimento/volume. Por outras palavras, consegue-se criar um produto de excelência com o melhor rácio euro por litro de capacidade». Com a procura que têm tido, em 2022, a WiseShape já conta estar presente nos produtores mais exigentes e inovadores do mercado, nomeadamente nas Regiões Demarcadas do Douro, Dão, Vinhos Verdes e Trás-os-Montes.