A adega que revolucionou o vinho argentino
Ao longo de mais de um século, Catena Zapata desempenhou um papel decisivo na projeção da Argentina para o patamar dos grandes produtores mundiais. A sua história é, sobretudo, a de uma família visionária que desafiou limites e, geração após geração, redefiniu o rumo da viticultura nacional.
Quem nos recebe na adega para nos guiar na visita é Carolina Fuller, uma das figuras mais reconhecíveis do sector, famosa já no meio pelo seu chapéu decorado com pins. Hospitaleira, bem humorada e muito profissional é, desde maio de 2022, responsável de Enoturismo (Turismo e Hospitalidade) de Catena Zapata. Formada pela Escola Argentina de Sommeliers (EAS), trabalhou já em enoturismos de algumas das mais reconhecidas adegas de Mendoza (como a Bodega Tapiz e a Bodegas Salentein) e é detentora de um aprofundado conhecimento técnico de vinhos, que, aliado a uma visão estratégica de turismo, integra na perfeição storytelling, vinhos, terroir, arquitetura e hospitalidade.
Já nos vinhos, a estrela é Alejandro Vigil. A trabalhar em Catena Zapata desde 2002, é formado em agronomia e enologia, sendo um dos grandes responsáveis pela consistência e qualidade dos vinhos de alta gama da casa. Sob sua direção, rótulos como o Catena Alta Malbec ou os vinhos de parcela provenientes da Vineyard Adrianna ganharam reconhecimento internacional, conquistando pontuações acima de 95 em publicações como Robert Parker e Wine Spectator. Por outro lado, desde a década de 1990, Laura Catena – da quarta geração da família, bisneta do fundador, médica e apaixonada por ciência – tornou-se também ela uma figura central da adega. Fundadora do Catena Institute of Wine (CIW), lidera pesquisas científicas que aprofundam o conhecimento sobre os solos, microclimas e altitudes de Mendoza. Graças ao CIW, a adega consegue explorar ao máximo o potencial de cada vinha, especialmente das parcelas de alta altitude, hoje marca registada de Catena Zapata. Entre outras questões relevantes, o instituto demonstrou por exemplo, que a casta Malbec pode expressar o terroir com a mesma nobreza de clássicos elaborados com Pinot Noir ou Cabernet Sauvignon, revelando elegância, fruta sedosa e intensidade. Conclui-se assim que a colaboração entre Vigil e Laura Catena é a chave do sucesso da adega. Enquanto Vigil garante a excelência técnica de cada vinho, Laura assegura inovação, estratégia global e a preservação da tradição familiar. Uma dupla que consolidou Catena Zapata como referência mundial, ajudando a elevar a Argentina a um nível mundial.



Feitas as apresentações das personagens principais da actualidade, Carolina Fuller segue a visita e regressa ao passado. Conta-nos a história do emigrante italiano, Nicolás Catena, que em 1902 plantou as suas primeiras vinhas em Mendoza, então dominada por vinhos simples para consumo interno. Mas seria o seu neto, também chamado Nicolás Catena, quem, quase um século depois, revolucionaria a região. Nos anos 80, enquanto a Europa consolidava o seu prestígio e os Estados Unidos viviam o boom dos vinhos da Califórnia, a Argentina ainda não tinha um lugar definido na viticultura mundial. Dinâmico e empreendedor, Nicolás Catena decidiu mudar isso. Viajou, estudou, provou muitos vinhos e percebeu que, para competir com os maiores, era preciso romper com o convencional. Foi assim que, de forma ousada, decidiu plantar vinhas em altitudes, algo até então impensável.
Assim nasceu a Vineyard Adrianna, em Gualtallary, Vale do Uco, uma vinha plantada a 1.500 metros de altitude, num terroir extremo de temperaturas baixas, exposição solar intensa e solos pobres. Condições que, pasme-se, permitiram obter uvas de enorme frescura, acidez e concentração, que deram origem a vinhos de excelência, reconhecidos internacionalmente. Rótulos como Catena Alta Malbec, Nicolás Catena Zapata e os vinhos de parcela da Vineyard Adrianna figuram hoje entre os melhores do mundo, com publicações como Robert Parker, Decanter e Wine Spectator a reconhecerem frequentemente Catena Zapata como referência global de qualidade. Hoje, como já foi referido, é Laura Catena, bisneta do fundador, quem está à frente das operações, fazendo desta adega uma das mais renomadas e admiradas do mundo.
A adega principal, projetada pelo arquiteto Pablo Sánchez Elías (o edifício na foto de entrada) é um local funcional, mas também um símbolo do enoturismo internacional. Inspirada nas pirâmides maias, representa monumentalidade, simetria e funcionalidade. Os seus corredores largos, rampas e salas de vinificação permitem visitas guiadas, quase cinematográficas, conduzindo o visitante desde a uva até à garrafa. Os espaços de armazenamento e barricas favorecem a circulação natural do ar e a manutenção ideal da temperatura, demonstrando como a arquitetura consegue aliar eficiência e estética.
No Enoturismo, além de percorrer a pirâmide, o visitante pode visitar as vinhas e fazer a prova de vinhos. Há ainda experiências diferenciadas, como provas temáticas harmonizadas com música, ou a oportunidade de criar o seu próprio blend, com o apoio de guias especializados. Além disso, o restaurante da adega ‘Angélica – Cocina Maestra’, oferece uma experiência gastronómica de topo. Sob o comando dos chefs Josefina Diana e Juan Manuel Feijoo, o restaurante – premiado com uma Estrela Michelin e uma Estrela Verde – serve um delicioso menu degustação com 12 passos, pensado para harmonizar com os vinhos da casa, entre outras iguarias.




Catena Zapata olha agora para o futuro ao explorar novas regiões como Salta, San Juan, La Rioja e Patagónia. Ao mesmo tempo, investe no estudo e na produção de vinhos a partir de castas históricas e menos comuns, como Bonarda, Criolla, Cabernet Franc e Nebbiolo, criando rótulos inéditos. Uma visão que continua a colocar a adega num lugar de vanguarda, perpetuando o legado familiar e a consolidação da Argentina como referência internacional em vinhos de alta qualidade.

VINHOS PROVADOS
Entre os vinhos provados, o Catena Alta branco Chardonnay 2023 destacou-se pela elegância característica da casa: preciso, fresco e com uma integração equilibrada da madeira, fruto da fermentação 100% em barricas de carvalho francês e de um estágio de 10 a 14 meses em barricas de primeiro, segundo e terceiro uso. Revelou fruta madura e uma acidez vibrante, mantendo o equilíbrio típico desta casta.

O Catena Zapata tinto Malbec 2022, um verdadeiro clássico argentino, tem um perfil profundo, sedoso e envolvente. O seu rótulo, igualmente emblemático, é uma homenagem visual à trajetória histórica da uva Malbec, desde as suas origens na Europa até o renascimento e ascensão na Argentina. A etiqueta retrata quatro figuras femininas simbólicas, cada uma representando uma etapa da história da Malbec. A origem europeia, a migração para as Américas, o declínio na Europa devido à filoxera e, finalmente, o florescimento da uva na Argentina sob a égide da família Catena.
Já os Nicolás Catena Zapata tintos 2020 e 2005 foram provados lado a lado para evidenciar a capacidade de longevidade da adega. O 2020 mostra-se ainda jovem e vibrante, com frutas escuras intensas, taninos firmes mas polidos, acidez equilibrada e uma intensidade aromática que aponta para grande potencial de guarda. É um vinho energético, em fase de construção, que revela a elegância típica do corte Malbec-Cabernet Sauvignon da Catena Zapata.
O 2005, por sua vez, exibe a complexidade adquirida com quase duas décadas de envelhecimento. A fruta amadureceu para notas mais secas e sofisticadas, com nuances de couro, tabaco, especiarias e leves toques terrosos. Os taninos estão mais integrados, a acidez mantém o frescor, e o conjunto resulta num vinho profundo e elegante, demonstrando claramente uma grande capacidade de evolução.